quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

Multidão

Multidão
Wellington Trotta

Mesmo no meio da multidão de compactos rostos,
fisionomias misturadas num perder-se de peculiaridades
no vazio uniforme desvairado-insistente,
de muitos andares sem saber o que desejam,
ou que só desejam, e desejam muito
sem atentar que desejam por desejar incessantemente...
... mesmo nessa multidão de compactos semblantes,
mixórdia de expressões perdidas em pensamentos iguais e pueris,
tão obscuros que me vi cercado por uma escuridão de significados,
portas que fechadas para o tudo se abriam para o nada, solenemente,
no bater de pernas na velocidade de lábios desconexos,
numa realidade só julgada pelos mais loucos critérios de verdade...
... zombavam de mim, anonimamente,
pela dominação que sofro cruelmente
de tua presente-ausência que
domina meu pensamento impiedosamente,
seja de noite ou de dia, sob sol ou chuva, mas sempre.
Mesmo que de repente, ao súbito o sono se acabe, acordo,
continuando a sonhar pelo calor de tua presença,
pela força de tua ausência, pelo odor de tua lembrança.
Tua imagem refletida no meu espírito assemelha-se ao caminho das nuvens:
de um ponto a outro temperando o rigor do sol,
embelezando o crepúsculo de mais um dia,
abrigando a lua em tuas imensas espumas brancas,
guardando no interior da chuva a terra onde me afirmo.
Tua presença castiga lentamente meus olhos undíferos e fixos,
espelhada numa folha escrita repleta de palavras banhadas pelo teu nome,
pela rima que tem em si, pela melodia que exala de si em si mesma.
Quando penso, e penso muito em ti, penso pensando no nada, nas noites
sem silêncio e na leitura sem reflexão.
Quando penso em ti sou tomado por ondas de sentimentos,
por uma espécie de velocidade arrebatadoramente ingênua,
sem direção para qualquer lugar que se tenha ventura.
Tua presença, tua ausência, tua lembrança não causam dor,
apenas um estado d’alma reflexivo nas estruturas do ser,
na certeza do tempo que transforma paisagens e esculpe formas,
 erige normas de se trabalhar mãos, sonhos e esperanças.
Tua presença caminha por onde caminho,
vivo, leio ou mesmo completamente parado,
presença que ensaia despedida pelo adágio de um sorriso,
por uma pincelada de cores que borrando o papel em branco,
constrói contornando seu rosto na expectativa-perspectiva
sobre meu peito no infinito limitado de suas mãos.






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